Joaquim Barbosa: herói de um povo triste porque necessita de heróis

Querem a prova de que o presidente do Supremo Tribunal Federal – STF fala verdades? A indignação que desperta no meio político. Sua excelência é um exemplo de superação das dificuldades, oriundo de berço humilde, tendo vencido na vida exclusivamente pelo estudo, pela inteligência, pelo mérito, enfim. E tal característica desperta a ira dos que se locupletam no poder público, dos que se tornam miliardários tendo como único talento o dom de iludir, de dissimular, de enganar a plebe rude.
O nobre jurisconsulto e seu martelinho causou algumas dores lancinantes em mensaleiros, em transportadores de dólares no interior sórdido de cuecas, em finórios ladravazes que fazem da vida pública um portentoso balcão de negócios, nos que querem transformar os exemplares da Constituição Federal em papel higiênico, nos relutantes em aceitar que, em vez dos gabinetes suntuosos da Ilha da Fantasia, lugar de ladrão é na cadeia!
O ministro disse, certa feita, que os partidos são de mentirinha, não há consistência ideológica e programática, segundo ele, até mesmo por falta de interesse dos próprios dirigentes. “Querem o poder pelo poder”, disparou. Ah, pra quê! As hienas fizeram um barulho ensurdecedor. E como a pessoa que tem cecê, mau hálito, chulé não percebe a própria catinga que emana de si mesma, as hienas, bichos vorazes e carniceiros, não sentem o fedor da putrefação que exala de sua natureza necrófaga.
Mas pelo menos as hienas irracionais são o que são, não escondem sua natureza predatória, ao passo que as racionais se encafurnam na empáfia, na demagogia, fingindo a seriedade e lhaneza de um monge franciscano. Os políticos componentes da nobre ala das exceções — que felizmente existem e mantêm ligado o fio de esperança — deviam se solidarizar com o ministro e virem a público para dizerem, em alto e bom som: “ele está certo; temos de mudar urgentemente essa balbúrdia em que se transformou o sistema político brasileiro.”
Qual ou quê. O silêncio dos bons foi mais barulhento que a balbúrdia dos maus. Aposentando-se precocemente, para uns em razão do sério problema de coluna que o atormenta; para outros, devido a ameaças contra a sua vida e a de seus familiares, ou por ambos os motivos, poucas vozes políticas lamentaram com o vigor da sinceridade desfalque tão insidioso no Poder Judiciário brasileiro.
Triste o povo que precisa de heróis, dizia o dramaturgo Berthold Brecht. E o que dizer quando um dos raros heróis se vê obrigado a botar prematuramente a toga no cabide?
Publicado em junho/2014