Sou liberal, progressista, esquerdista, centrista, direitista, tradicionalista, conservador, com muito orgulho, com muito amor…

Tolinho! Eu não passo de um pobre-coitado carente de ideologia (queria uma pra viver). Como estou me referindo a ideologia política, e como quem as tecem são os líderes políticos, querem ver como é difícil achar uma para encostar o esqueleto carcomido pelo tempo? Por exemplo: algum bom-jesuense pode apontar um político contemporâneo da terrinha, unzinho só e dizer: aí está um exemplo de idealista? Um homem ou uma mulher nos quais se pode observar princípios claros, valores transparentes? Que sacrifiquem uma eleição se tiverem de ganhá-la com acordos espúrios, incompatíveis com seus conceitos e referenciais de vida?
Se o político A é inimigo figadal de B (inclusive no aspecto doutrinário), mas se a união de ambos for interessante personalisticamente para os dois, alguém duvida de que se unirão? Não aposto uma mariola mordida! Aliás, vejam as últimas eleições por estas bandas. Em nível nacional, Fernando Collor, quando em campanha em 1989, dizia ser a primeira coisa a fazer ao conquistar a Presidência era mandar prender o antecessor, José Sarney. Vejam na foto que cena comovente do “prendedor”, à esquerda, e do “prendido”, hoje.


Pois é. O tal do pragmatismo foi comendo, de forma voraz e inclemente, tal como aquele joguinho Pacman, os fundamentos filosóficos da política. Acaso temos direita aqui no Brasil? Esquerda? Centro? Não há nada disso, gente, apenas interesses muitíssimo bem orquestrados. Agremiações políticas de há muito perderam a aura romântica de serem representativas de uma causa. Nesse estado de vazio ideológico, as críticas e (vá lá) os elogios são direcionados aos agentes, e não ao que inexiste, é óbvio.
Apegado aos rótulos, às nomenclaturas remanescentes apenas como referências, quem me acusa de estar ao lado direito de Deus Pai (acredite, leitor, os comunistas de hoje comem hóstias e fazem o Sinal da Cruz três vezes ao dia) considera-se certamente um esquerdista. Não é não, sinto dizer que você também não tem uma ideologia pra chamar de sua. Você, amigo, embora bem-intencionado, é apenas mais um figurante, como eu, da tragicomédia brasileira.
E vamos combinar: eu sou o início, o fim e o meio, como cantava Raul.