O tempo vagaroso é o mesmo que corre. E livrai-me das festas, amém

Meu caçula de 14 anos resolveu que é hora de pilotar motocicleta. Aquela pressão velha conhecida de pais de adolescentes, tipo todo mundo anda, só ali na pracinha, não vou correr, nem cair, nem ir longe, etc.
— Quando você completar 18 anos eu deixo, retruquei para sobrancelhas quase formando duas letras U invertidas. E completei, a despeito das sobrancelhas: — porque então você estará habilitado e poderá sair por aí legalmente sem que eu me preocupe de um policial bater em minha porta a qualquer momento com as sobrancelhas mais fechadas que as suas querendo me enquadrar por desrespeito à lei.
— Mas, pai, quatro anos é muito tempo. Vai custar a passar.
Tudo é tão enfadonho… Todo homem, ao nascer, tem a consciência da imortalidade. Daí a morte ser tão injusta, dizia Carlito Maia. Meu filho, com a consciência da imortalidade, julga que quatro anos passam devagar, quase parando. Neste momento fico pensando que deveriam desenvolver algum medicamento persuasório para se aplicar na veia e meu filho percebesse que quatro anos passam depressa até demais.
Relaxem, porém. Não vou filosofar sobre o tempo. Está chegando o Natal. Mais um, a totalizar 56 na minha vida que, agora, vai ganhando velocidade vertiginosa em contraste com a do meu filho, a trafegar como uma tartaruga míope. O que acho das festas? A cada ano me distancio do chamado espírito do Natal e mais me entediam as comemorações de fim de ano. Não vejo o que comemorar. Para começar, todos sabem, mas poucos se lembram do motivo principal das pomposas solenidades natalinas. Entendo os festejos principalmente num mundo de alucinações e delírios como o nosso não como uma singeleza ao Menino Deus, mas uma afronta, uma heresia, uma blasfêmia.
Mesmo com Sua infinita misericórdia e tolerância Ele há de repudiar os convescotes de dissimulação e desfaçatez onde o que mais conta são os prazeres mundanos — em especial os do ócio e da gula — e a exacerbação do egoísmo e das práticas hedonistas, já disse isso em outro texto. Congratulações às exceções, aos homens e às mulheres que não se deixaram cooptar pelo materialismo insano nem vacilaram em sua fé. Formam um seleto clube do qual também não tenho permissão para frequentar.
Por outro lado, essa constatação me traz certo alento. Pode estar nela a espoleta deflagradora de mudança de rumo em busca de uma vereda mais segura e livre das preocupações com a inclemência e a inexorabilidade do tempo.
Publicado em dezembro/2010