Apocalipse

Pessoas catam com o frenesi da fome a comida estragada nos monturos da favela; ladrões presidem Senado, governam; polícias viram ladrões e botam o capuz dos bandidos; o presidente diz que vai fazer o sucedâneo de sua política maquiavélica e é bem capaz de cumprir; as cestas básicas dos flagelados da seca do Nordeste viram objetos de barganha política; o FMI suga o sangue dos brasileiros com o beneplácito dos seus governantes; banqueiros ficam mais ricos, e os pobres, mais pobres; Luiz Estêvão está solto, Salvatore Cacciola goza as delícias de Capri através do suor do povo trabalhador, e o juiz Lalau brevemente terá também a condescendência da Justiça que solta os tubarões e aprisiona os lambaris; o sentimento altruístico está sedado; o instinto da perfídia, desamor e desonra, na plenitude; os maus, com a torpeza a cada dia renovada; os bons, na conformidade de uma imensa manada que perde a capacidade de se indignar e a vergonha da resignação sem luta.
Eu não defendo luta armada, motins ou sublevações. Apenas amaldiçoo minha própria incapacidade de encontrar alternativas.
Publicado em outubro/1999