Alcácer do desengano

A sociedade da terra chamada Brasil/
se acomoda nos desvãos profanos/
da política que mui ladrão sutil/
dela se serve nos butins insanos.
Gente enfermiça! Por que assim fugiste?/
Da tua glória em confrontar a peste,/
Não vês, não vês… O semblante triste…/
De Norte a Sul, de Leste a Oeste?/
Que será de nós, brasileiros tétricos?/
Quando impuserem a conta do gravame,/
Por descomunais deslizes antiéticos…/
Santo Deus! Que colossal vexame!/
A postos a luz da crepitante vela,/
Ilumina a vereda mais candente,/
Porém só os fortes é que caminham nela,/
Pro´s medrosos tal não é nada prudente!/
Pego o teclado… inspiração sublime!/
Pra entristecer… inquietações tamanhas…/
Violo virtuais espaços… não é crime!/
É resistência às práxis mais tacanhas!/
Morrer de frio quando o peito é brasa…/
De indignação que em meu ser se aninha,/
Vós todos, de barriga cheia em casa,/
Não sabeis quão vazia é a alma minha./
Cheia, sim, mas de fatal perfídia,/
Da demagogia de políticos abjetos,/
Coonestados pela engajada mídia,/
Que se nutre da escoalha e seus dejetos./
Mesmo artistas que eclipsam Aldebaran,/
Desfiam loas a essa cáfila sarnenta,/
Revelação cabal de consciência anã,/
Pois o cão não morde quem o alimenta./
Brasil, Brasil, este sofrer pungente,/
Em que séculos e quais séculos acabará?/
Quando é que esta nação a Deus temente,/
De honra e de grandeza triunfará?/
Não estarei mais aqui para o desfrute,/
De uma pátria justa e fraternal,/
Pois derrotado pelo vil embuste,/
Já morri um ensimesmado abissal!/
Quiçá os netos, dos netos dos meus netos,/
Desfrutarão o mel de porvindouras messes,/
Se agregarem coragem e preceitos retos,/
E abominarem as migalhas das benesses./
Não sois, Pai, como dizem, brasileiro…/
Pois se fôsseis não permitiríeis a desventura,/
De serdes tal e qual alcoviteiro,/
Dos demônios que nos trazem amargura./
Nosso povo embarca fácil na marola,/
E se contenta com o óbolo desencorpado,/
Em coro de carpideiras louva a esmola,/
Que leva o roto a falar do esfarrapado./
Se vós tivésseis, Deus, santa clemência,/
Impediríeis assaz degradação,/
Cercaríeis urnas de fel concupiscência,/
E ressuscitaríeis a moral desta nação./
Do Inferno dantesco cujo pórtico diz:/
-abandonais todas as esperanças ó vós que entrais,/
Sou sócio solerte pelo que não fiz,/
Só palavras, palavras, e nada mais!/
Que ao menos porém indignadas,/
Contra a suprema e a torpe humilhação,/
De ouvir vozes pateticamente conformadas,/
Com rapinagem, mentira e empulhação!/
Meu verbo, amigos, já rateia, não resiste,/
E a outra jornada será inda mais árdua e dura,/
Como disse o genial poeta triste,/
“Das estrelas a poeira é tudo o que perdura.”/
Produzido em setembro/2006