Aqui eu guardo meus escritos.

Obrigado pela visita.

Bonjesino e a faculdade

Bonezinho acredita que agora vai! Repudia a hipótese da implantação de uma faculdade em Bom Jesus continuar a ser falsa promessa de campanha, uma ladainha ridícula que já não desperta credulidade alguma. Lastreia sua convicção evocando o princípio de modernidade e ação empreendedora alardeadas por seus políticos, através das quais desenharam o caminho do poder. O raciocínio até que é racional e lógico:

— Vê só, chefia, dá pra continuar suportando a humilhação de ainda enviarmos ônibus e mais ônibus abarrotados com os nossos jovens em direção a outros municípios na busca de um ensino superior?

— Tem jeito não, Bonjesino. Uma incoerência da gota serena, nosso lugar tão pródigo em gerar intelectos privilegiados ainda não possuir uma mísera faculdade.

— Não comece a criticar, chefia. Tenho certeza de que as autoridades competentes, sensíveis e convergentes a essa necessidade estão efetuando gestões junto ao Ministério da Educação.

— Ô, se tão.

— Tão sim. Tomam as devidas providências para formar nossos estudantes aqui mesmo, o que disponibilizará oportunidades para mais pessoas e consequentemente melhorar o padrão cultural, que por sua vez vai balizar demais melhorias.

— Uau, Bonjesino! Onde diabos aprendeu a falar bonito assim, homessa?

O colosso esboçou um gestual de alguém emocionado e disse:

— Naquele comício, chefia. O candidato a prefeito falou tão bonito que cheguei a chorar…

— De emoção?

— Claro. Nunca vi ninguém tão preocupado com nossos estudantes, com nossas cidades, com nosso futuro. Gravei o discurso e até decorei as palavras…

Publicado em fevereiro/1999

Vereadores: cortes nas côrtes

O dispositivo legal que reduz a quantidade de vereadores já nas próximas eleições é, em tese, um fato auspicioso para a nação. Unindo-se ao comecinho das punições aos corruptos e à real percepção por parte dos políticos de que a massa tende a se sublevar (ainda que essa percepção seja despertada por bandeiradas e ovadas), a decisão que restringe as vagas nas câmaras municipais vem a calhar no embalo da moralização que parece estar saindo de uma forma embrionária para ganhar ares de realidade.

A grandessíssima quantidade dos chamados representantes do povo é uma das bactérias que formam o inchaço do Estado, e sua redução promete atenuar os sofrimentos de uma entidade cambaleante, aturdida. O ideal seria que viesse acompanhada da redução também nos quadros funcionais do Congresso, hoje contando (não se sabe para que) com 513 deputados federais e 81 senadores e que, contudo, não conseguiram ou não quiseram votar nenhuma reforma de vulto em benefício dos seus representados.

Mas como nem tudo é perfeito, e devagar se vai ao longe, bem-vindo seja esse pedacinho de austeridade a reduzir a torra de dinheiro público sem que nem por quê. Não se justifica em nenhuma hipótese que municípios paupérrimos como Bom Jesus do Norte, São José do Calçado, Apiacá, Mimoso e outros tantos dêem-se ao luxo de formar pequenos exércitos de legisladores que pouco têm a fazer, ganhando somas proporcionalmente astronômicas em relação ao tempo de “trabalho” que dedicam aos municípios (no mais das vezes uma única reuniãozinha semanal, de não mais que duas horas).

Além disso, boa parte desse tempo é tomado para discussão de amenidades, como nomes para logradouros, votos de pesar e distribuição indiscriminada de condecorações, vulgarizando os títulos honoríficos na mais deslavada e cínica demagogia, que salvo raras e honrosas exceções têm o objetivo de angariar simpatias que lhes possam garantir o continuísmo da sinecura. Nem mesmo a chamada independência dos poderes é defendida e colocada a serviço do povo, pois invariavelmente o Legislativo funde-se ao Executivo porque este quase sempre se faz representar pela maioria nas casas de leis, seja por circunstâncias naturais quando forja nas urnas sua maciça base de apoio, seja acenando com composições antiéticas que cooptam alguns caráteres nem sempre convictos em honradez e seriedade.

Num raciocínio ingênuo, simplório até, a redução da edilidade poupa Reais bem reais pela menor quantidade de remuneração a pagar, menos gastos em estrutura, desde contas de telefones, cafezinho, até o papel higiênico. Mas não é só. Computem-se aí os malfadados acertos, os agrados e outros obséquios intermediados pelo dinheiro público e encontra-se uma cifra respeitável.

Nove é o número mínimo de vereadores preconizado pela Constituição de 1988 e que parece vai ser instituído nos pequenos municípios brasileiros. É um número grande ainda. Só para ilustrar, Vitória, capital de um Estado da Federação, provavelmente terá 11. Ainda assim, se todos cumprirem as determinações da Lei, Bom Jesus/RJ diminui seis cadeiras, Bom Jesus/ES, duas, São José do Calçado, quatro, Apiacá, duas e Mimoso, quatro. Já é uma boa chama para a queima da obesidade mórbida que pesa demais em cima de municípios anêmicos de saúde financeira.

O alívio pode, deve e é imperativo que seja revertido em melhorias para o cidadão comum, fatigado pela carga pesadíssima que indeclinavelmente carrega com pouca ou nenhuma compensação.

Publicado em junho/2000

Uma pergunta ao prefeito de Bom Jesus do Norte, Dr. Adson Azevedo Salim

Bom Jesus do Norte. Foto aérea: Farley Couto

Dr. Adson.

Quando, enfim, o trânsito de sua cidade receberá um pouco de atenção do poder público? Ali na altura do Supermercado 5 Irmãos, Sr. prefeito, a coisa já beira ao surrealismo. Sabe-se que o Sr. terá um trabalho árduo nem tanto para conseguir os recursos necessários para dotar de civilidade (esta é a dura, mas adequada palavra) o direito de deslocamento de pedestres e de veículos, mas terá de ter obstinação para quebrar as resistências que a cultura do provincianismo se enraizou de tal forma que nem parece que estamos no século 21.

Campanhas de conscientização, Sr. prefeito. Maciças. Densas. Repetitivas. E o vigor, em ações objetivas, do tamanho daquele utilizado no seu discurso das mudanças.

Publicado em outubro/2011

Sem nada; ou, não só de terra necessitam os brasileiros

Da República Velha, da era Getuliana até a República dos generais, do Estado Novo, do Brasil de Tancredo, Sarney, Ulysses, Collor, Itamar e agora do bem-intencionado FHC, temos acompanhado o crucial problema da terra no Brasil. Discute-se muito este assunto em épocas de eleições, diria até que de forma casuística e eleitoreira. Nestes períodos, todos os políticos (inclusive os da UDR e os que representam os donos de propriedades improdutivas, imobilizadas para efeito especulativo, ou mesmo de proprietários desinteressados por estarem envolvidos em outros negócios) se dizem dispostos a equacionar o grave problema. Passadas as eleições, entretanto, o assunto vira letra morta.

No atual governo, felizmente, vislumbra-se, mesmo que tenuemente e a passos de cágado, alguma coisa parecida com uma política coerente de assentamentos. Dirá o leitor que é pelo fato de que o atual governo é generoso, tem compromissos com as turbas esfaimadas, com os indigentes e miseráveis das cidades. Ledo e Ivo engano. É que já não dá mais para segurar, não dá mais para ignorar a modesta, porém eficiente organização dos sem-terra, que quando apartada dos oportunistas que se aproveitam do grupo para fazer política rasteira, legitima-se pelos objetivos. Não dá para passar despercebida a mídia veiculando verdadeiros exércitos de miseráveis à procura de um lugar onde possam viver com dignidade e através do suor do seu trabalho, quase sempre ocupando terras improdutivas, muitas das quais sendo meramente objeto de especulação ou apenas satisfazendo a sanha egoísta dos seus proprietários. O povo não pode continuar a conviver com a tremenda injustiça social que o assola, (dos filhos deste solo, és mãe gentil), com o governo privilegiando banqueiros falidos, usineiros desonestos e políticos profissionais especializados em fisiologismos, casuísmos e adeptos da velha máxima do “é dando que se recebe” em detrimento das massas famintas e desesperadas.

Para se ter uma ideia da calamidade social em que o país se encontra, dos 270 países que compõe o Planeta, o Brasil é um dos últimos colocados entre aqueles com as melhores distribuições da renda nacional. Enquanto 10% dos abastados, com suas bochechas coradas e suas contas bancárias, aqui e no exterior, abarrotadas de dinheiro abocanham 90% da riqueza, 90% dos marginalizados que não foram bafejados pela sorte ou não tiveram vocação para a pilhagem sofrida pela nação sobrevivem, raquíticos, Deus sabe como, com os 10% da migalha restante. Pelas contas oficiais de Brasília, o índice de desemprego está na casa dos 6%. Ora, mesmo que se tenha muito boa vontade em acreditar neste número, os desempregados chegam à astronômica cifra de 3,6 milhões de pessoas, o que equivale a 12 maracanãs lotados.

Enquanto isso, na corte… Tudo vai indo muito bem, obrigado. Exceto apenas pela desagradável tarefa de girar um pouquinho a manivela da válvula de escape, nossos dignos representantes levam a vida que pediram a Deus. Mas sejamos justos. Tudo tem que ter um começo, e FHC deu o pontapé inicial em alguns projetos sociais, inclusive no projeto dos assentamentos. Algumas pessoas despossuídas já estão vendo seus horizontes toscamente delineados. Para os operadores da válvula de escape, contudo, ainda resta muito trabalho, pois o Brasil não é composto somente por sem terra, abrigando também em seu seio os sem emprego, os sem casa, os sem saúde, os sem ensino, os sem segurança, os sem nada.

Publicado em maio/1999

Ignácio e a oposição

E indiscutível que a imagem do governador José Ignácio Ferreira ficou comprometida, e muito, com as denúncias e as evidências de que há corrupção no governo do Espírito Santo. Isso muda completamente o cenário para as eleições do ano que vem porque fortalece uma oposição que, a despeito de contar com nomes do vulto de um Paulo Hartung, de um João Paulo Velloso Lucas, de um Theodorico de Assis Ferraço e outros não menos relevantes, era considerada dispersa e sem grandes possibilidades de aglutinação e harmonia. Ficou, portanto, como grande trunfo dessa corrente não uma convergência de cunho ideológico, mas a conquista de uma importante via de acesso ao poder, tomada de forma estabanada unicamente pelas denúncias, passando ao largo de um debate amplo e consistente sobre matérias programáticas.

Esse é o ponto nevrálgico da coisa. É esse o maior pecado das oposições. Não que as denúncias não devam ser feitas e levadas ao último termo de desenlace. Elas obrigatoriamente têm de ser difundidas, apuradas com rigor, e se for o caso produzir punições exemplares. Só que elas aparecem de forma acintosamente eleitoreiras, numa abordagem sensacionalista e não dissimulada de princípios persecutórios do poder a qualquer custo, fato que diminui a credibilidade do algoz e minimiza os efeitos bombásticos da catilinária. No caso do Governo do Espírito Santo, as acusações são graves, consistentes, mas nada ficou comprovado ainda contra o governador José Ignácio, propriamente, tal como tem acontecido inclusive com o presidente FHC em vários casos ao longo dos seus dois mandatos.

Ignácio garante com isso uma boa reserva de oxigênio e poderá até restabelecer suas forças, providência que já iniciou, destituindo o primeiro escalão que estava na berlinda e integrando-se mais ao Legislativo, ao qual passou a depender como do ar que respira. Se essa união política possibilitar casamento, então as forças oposicionistas terão forçosamente de enfrentar um adversário ainda grogue mas com grande poder de fogo pela imagem que construiu de um político moderno e eficiente, reconhecido por resgatar as finanças do estado e implementar reformas de base importantes. Por ironia, esse poder pode até mesmo ser reforçado pelo titubeio da oposição em agregar nomes de consenso, porque é grande o número de pretendentes em suas hostes.

No tabuleiro da política estadual, fica no momento uma impressão de largo favoritismo para os antagônicos, mas a exemplo do futebol, o jogo só acaba quando o árbitro dá o apito final. E se José Ignácio for um estrategista do naipe do ex-treinador Oto Glória (1917 – 1986) como exemplo, ele consegue reverter o placar, na pior das hipóteses dando muito trabalho ao adversário.

Dessa briga pode emergir o desagravo em forma de desenvolvimento para o Estado e mais transparência nos atos administrativos para o capixaba.

Publicado em junho/2001