Aqui eu guardo meus escritos.

Obrigado pela visita.

Crianças fora da escola, prisão para os pais

 

Uma cultura secular não se muda da noite para o dia, senão com medidas duras, radicais. No Brasil periférico ainda vigora com mais intensidade do que se pensa a mentalidade rudimentar, dos tempos imperiais: braços devem ser mais utilizados do que a mente. Muitos pais ainda não se livraram do conceito de que os filhos não devem ir à escola para ajudar no trabalho doméstico, que lhes garanta o sustento. Alguns futuros pais deste fim de milênio, tal como predecessores centenários auguravam, torcem efusivamente para que a criança concebida seja do sexo masculino, mais capaz, portanto, ao trabalho duro, braçal.

Aliado a uma infraestrutura educacional adequada, tem de haver o rigor da lei para os cidadãos negligentes com os filhos: prisão para estes. Sim, prisão, a exemplo do que já é feito em vários municípios, como o da Serra/ES, por exemplo. Lá, quem deixar intencionalmente o filho fora das salas de aula poderá ser levado à prisão. Pais e responsáveis serão multados e detidos até um mês se não incentivarem crianças e adolescentes a estudar. A punição é prevista num Projeto de Lei em debate no Congresso Nacional, em Brasília, mas é realidade há um ano no município. E a ameaça deu resultado. Em 1999, nada menos que 99% dos alunos evadidos entre 7 e 14 anos voltaram às escolas, e os índices de evasão escolar caíram de 6% em 1998 para 0,9% no ano seguinte. Em números absolutos, significa dizer que, se 1.148 estudantes não frequentaram as aulas há dois anos, apenas 185 ficaram distantes dos livros no ano passado. “E não foi preciso prender ninguém. Os pais entenderam que podiam ser processados por crime de abandono intelectual”, disse a juíza Hermínia Maria Silveira Azouray, citando o artigo 246 do código penal.

Projeto tem custo zero 
Um dos pontos mais comemorados por autoridades do município da Serra é o custo zero do programa de combate à evasão escolar. De acordo com a secretária de Educação Márcia Lamas, o único gasto no projeto Pró-Escola seresume a cestas básicas doadas por quem é processado no Juizado Especial Criminal. “Não se pode alimentar o país de analfabetos. Basta boa vontade para reverter a evasão escolar e, consequentemente, diminuir a violência infanto-juvenil”, completou a juíza Hermínia Maria Silveira Azoury.

Se não foi necessário dinheiro, foi fundamental esforço e cooperação. Para pôr em prática e projeto Pró-Escola, representantes da Justiça e da prefeitura contaram com apoio de diretores do Ensino Fundamental. Listas com nomes e endereços de alunos faltosos foram reunidas e serviram para intimar pais a comparecerem em audiências na Justiça. Foram cadastrados 551 alunos. Do total, 499 retornaram às escolas e 52 não foram encontrados. “Cada diretor foi buscar o aluno em casa. E a cada bimestre são feitas novas listas. Para não ter desculpa, há 135 famílias cadastradas para receber cestas básicas”, observou Márcia Lamas.

Está aí uma boa ideia que pode ser implementada em Bom Jesus e região. Tolerância zero para o analfabetismo, para a ignorância, a maior calamidade a impedir o progresso material e espiritual da população.

Publicado em fevereiro/2000

Afasta de mim este cálice

 

Elegi com o auxílio do clima natalício (de conotação às avessas para mim) o tema que dele hei de estabelecer alguns considerandos próprios na atmosfera que mais domina corações e mentes nesta época. Não consigo mais absorver, nesta altura da vida e certa decepção pela carência do exercício da solidariedade, algum alumbramento capaz de descortinar em meu íntimo sincera alegria ou entendimento de coerência desta festa e das que dela se sucedem que justifique o estado de graça e encantamento.

Saibam de antemão os leitores que este texto pode deprimi-los. Parem por aqui se conseguem ver cores numa festa que encorpa as desigualdades, que recrudesce as injustiças, tonifica a hipocrisia e acirra a vaidade, deformidades milenares cuja evolução parece ter atingido o cume em nossa era. O artificialismo personificado em faces supostamente sensíveis e comovidas, atarraxadas por cima das verdadeiras, das atormentadas pelas vicissitudes sempre materiais, às vezes morais, é algo que embrulha os estômagos dos que embora obrigados a dançar para não perecer conservam aversão pela música e o ritmo.

Nesta época, a dissimulação e a impostura se revelam sem retoques. Mimos extremosos, sensações degustativas as mais sublimes, troca de afagos e as demais mesuras de sempre decorrem de atitudes pretensamente reverenciosas ao nascimento de Alguém que poucos se lembram no insano cotidiano e muitos sequer no 25/12. Saracoteiam à luz de velas e lampadinhas piscantes interesses egoisticamente afetivos, econômicos ou de poder.

A data natalícia se transformou num acerto de contas, um tempo de pretextos para nos justificar diante de um espelho com o aço corroído pelo esquecimento que temos para com nossas faltas e nossas a cada dia mais e mais robustecidas imperfeições. Em vez de nos voltarmos para nosso interior e questionarmos nossos valores de modo a modificarmos nossos passos, preferimos fingir. Sem querer generalizar e enfaticamente cultuando as gloriosas exceções (vos saúdo devotamente, homens e mulheres de boa vontade), boa parcela nos portamos no transcorrer do ano entregues à hipocrisia, simulando sermos o que gostaríamos, para os outros e para nós mesmos. Especialmente nesta época, em vez de nos prostrarmos diante da tribuna da consciência preferimos continuar a farsa, até nos apresentando de bons. E o que é pior: acreditando em nossas próprias mentiras!

Quem haverá que não condene (da boca para fora; envidar esforços para minorar, aí complica) a existência de amor e carinho para alguns, indiferença ou ódio para outros; castelos e mansões num lado, favelas e cortiços pestilentos a abrigar matérias infelizes, no outro lado; brinquedos caríssimos, de tecnologia avançada para uns poucos infantes privilegiados, e para a maioria sequer um boneco ordinário; comensais com as panças abarrotadas de iguarias as mais diversas e sublimes, noutras barrigas o ronco injurioso de uma fome abominável e maldita?

Em qual escritura está o dispositivo divinal que permite nossas papilas gustativas se agitarem freneticamente pelos salmões e caviares enquanto assistimos na TV gente pequenina e gente grande disputando sofregamente os monturos dos lixões nas grandes cidades? De suportarmos às vezes sem um franzir de cenho cenas como a daquelas crianças etíopes (e de outras nacionalidades mais) esqueléticas sugando sangue nas tetas de suas mães-zumbis com os olhos toldados pelo tormento da fome? A estas pessoas errantes, sem pátria, sem lar, sem razão, lhes é negada até mesmo a imponderabilidade da finitude da vida, a hora incerta para a sentença certa, que é a morte: vêem-na com indescritível pavor no dia a dia, dama da foice cruel, sanguinária. São nada menos que seres humanos, gente como nós, qual presas esfoladas vivas pelo predador, neste caso seu próprio semelhante.

O Filho de marceneiro que nasceu sem luxo e padeceu condenado pelas mãos de uma multidão ignóbil não podia ser tão afrontado, tão escarnecido, numa inversão de valores de tal ordem que se adequaria com mais propriedade se o que então se comemora fossem sua paixão e morte. Esta é a época do paroxismo da nossa encenação, onde os sentidos acumulados extravasam gloriosamente sob formas falsamente edificantes para retomarem sua face verdadeiramente corrompida e dissimulada com mais vigor nos dias que se sucedem.

Eis, leitor, leitora, o que experimento desde o momento da primeira piscadela de uma pequena lâmpada colorida, passando pelos irresistíveis apelos consumistas com as indefectíveis notas monocórdias e tediosas do Jingle Bell e as barbichas brancas em caras balofas, tão postiças quanto nosso modus vivendi. Perdoem-me por não lhes destinar as saudações de praxe. Falta-me legitimidade para o fazer porque também sou peça desta feroz engrenagem que move a vida em direção a mares revoltos da consciência para desaguar na farisaica província da hipocrisia, a mais povoada da alma.

Chegou até aqui? Parabéns!

Publicado em dezembro/2006

Tia Michelle

Tia Michelle é uma jovem professora da 2ª série do Ensino Básico da Escola Manoel Franco, em São José do Calçado/ES. É o seu primeiro ano nesta área sacrificante, a do Magistério, que tem infelizmente a atenção dos governantes de forma inversamente proporcional à enorme importância para o país. Reclamar com quem, entretanto, essa perversa inversão de valores? Com esse governo de Polichinelo? Com o papa?

É asqueroso que um deputado qualquer consuma num único mês, entre salários, mordomias e quejandos, o equivalente a 300 meses, ou 25 anos (quase uma carreira inteira), do vergonhoso vencimento das tias e tios brasileiros, sendo os professores os contribuintes pelo crescimento do país, e vários daqueles, pelo atraso, pela vergonha e pela injustiça social. A dedicação da Tia Michelle com seus alunos exemplifica a abnegação da maioria dos professores e das professoras brasileiros, movidos mais pela nobre causa da Educação do que pelos salários e condições precárias em que trabalham.

A vocação de educar é algo bonito porque significa compartilhar, produzir, modernizar, desalienar. Tal vocação é um dos mais sábios instintos da natureza humana, já que a própria perpetuação da espécie, de modo sustentável, passa obrigatoriamente pelo conhecimento. Meu filho Gabriel, de oito anos, estuda com a tia Michelle. Qual não foi meu espanto quando o vejo chegar certo dia, juntamente com alguns coleguinhas, em prantos, num chororô coletivo. Deles tomei conhecimento de que outros colegas, meninos e meninas, também estavam inconsoláveis porque a tia Michelle teria se despedido deles, iria assumir outra função não sei onde.

Até aí, nada demais, crianças costumam ter essas reações, depois se acostumariam com a outra tia. Qual nada! O chororô continuava numa progressão anormal, uma semana de olhos vermelhos, recusa em voltar para a escola, cochichos e comentários entrecortados de soluços, assunto “tia Michelle” sempre à tona até mesmo nos jogos de videogame, onde a alegria pela traulitada no vilão era neutralizada pelos sentimentos da lamentável perda.

Mas eis que a tempestade serenou, depois de uma semana de chuvas torrenciais. O choro se transformou em euforia, a tia Michelle continuará com eles, não sei se pela pressão emocional ou se decorrente de outras resoluções pessoais. O importante é que os lamentos cederam vez a vibrantes manifestações de alegria, a paz voltou a reinar.

Certamente que a tia Michelle vai gradualmente se aprimorar na profissão, se é que a levará adiante. A experiência gradativamente conquistada lhe apontará a forma de capitalizar esse seu carisma em prol de um ensino mais objetivo e proveitoso, para que a euforia infantil de agora se transforme em gratidão e reconhecimento adulto do futuro. Apesar da podridão política, que parece nunca ter fim!

Publicado em junho/2005

Mal de Alzheimer: um dos vilões mais terríveis da raça humana

Esta charge do Nani, embora o próprio artista faça uma ressalva de que muitos podem não concordar (queremos nossos entes queridos distantes da dama da foice), aborda o terrível Mal de Alzheimer. Trata-se de um distúrbio neuro-degenerativo que provoca progressivamente o declínio das funções intelectuais, reduzindo as capacidades de trabalho e relação social. Mas é também uma doença cujos sintomas, sua gravidade e velocidade variam de pessoa para pessoa.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 25 milhões de pessoas sofrem do mal de Alzheimer. Essa é a primeira causa de demência nos países desenvolvidos, e os especialistas acham que se tornará a doença do século XXI, na frente da Aids, do câncer e das doenças cardiovasculares. O mal de Alzheimer é a principal causa de demência em idosos, leva à morte e atinge duas vezes mais as mulheres que homens. A neurologista Valéria Bahia, integrante da Sociedade Brasileira de Neurologia, explica que 0,2% das pessoas acima de 60 anos têm a doença. A partir dessa idade, a cada cinco anos, a incidência do mal de Alzheimer é dobrada. Os sintomas mais comuns são:

– perda de memória, confusão e desorientação
– ansiedade, agitação, alucinação, desconfiança
– alteração da personalidade e do senso crítico
– dificuldades com as atividades da vida diária como alimentar-se e banhar-se
– dificuldade em reconhecer familiares e amigos
– dificuldade em tomar decisões
– perder-se em ambientes conhecidos
– inapetência, perda de peso, incontinência urinária e fecal
– dificuldades com a fala e a comunicação
– movimentos e fala repetitiva
– distúrbios do sono
– problemas com ações rotineiras
– dependência progressiva
– vagância.

O Jornal “O Globo” publicou uma matéria informando que cientistas descobriram uma droga promissora para a cura da doença.

Publicado em maio/2013

Intolerância

 

 

O chargista Jarbas retrata o fato incrível de a intolerância ser usada contra a…, intolerância! Marco Feliciano, o deputado federal (PSC/SP) que preside a Comissão de Direitos Humanos da Câmara foi alvo de uma saraivada de acusações de ser homofóbico. O assunto ganhou todas e mais algumas manchetes, em todas e mais algumas mídias, em todos e mais alguns rincões do Brasil e até do exterior por várias semanas. Como pode presidir uma instância que está lá para defender os direitos humanos, cujas minorias são as mais desrespeitadas, se o deputado tanto desrespeita…, uma minoria!

Para mim, cada qual faz de seus furinhos, falinhos e falões o que bem entender. Não tenho nada com isso se duas mulheres resolvem unir as borboletas, ou se dois homens embainham mutuamente suas espadas. E, claro, repudio toda e qualquer forma de intolerância, seja religiosa, de raça, de orientação sexual, de marca do xampu. Isso quer dizer que repudio também os intolerantes como os do desenho. Foi só o rapaz começar a dizer que é a favor da felicidade para, à menção das duas primeiras sílabas as pessoas se precipitarem nas catilinárias verbais julgando que ia se referir ao deputado Feliciano.

E se fosse? Acaso ele não tem o direito de ser a favor do deputado?

Publicado em maio/2013