“Tudo é relativo. Até mesmo a relatividade do Relativismo” – Roberto Campos

Lá se vai o 2º milênio. E cá estamos com o privilégio de transpormos a linha em direção ao 3º! O que levamos na bagagem? Será a nossa entrada carregada de triunfo ou pisaremos o tapete com os pés manchados de desdouros? Citando Roberto Campos (foto), “tudo é relativo. Até mesmo a relatividade do Relativismo”. Desde a conquista de um avançado nível da Ciência e da Tecnologia, ao espoucar de tiros e clarões de mísseis a denunciar nosso primitivismo, e, por conseguinte, uma grandessíssima incoerência, tudo parece efetivamente relativo.
Indicadores científicos levam a supor que em breve estaremos em condições de instalar barraquinhas em feiras-livres para a comercialização de órgãos do corpo humano. Um coração zero km, um fígado virginal para conduzi-lo ao encantamento dos primeiros teores de álcool, um pênis de tamanho e circunferência a gosto, até transplante de cabeça, que certamente poderá sair de fábrica com um narizinho aquilino, pomos salientes e par de olhos na tonalidade que se desejar já povoa a mente frenética dos cientistas.
Em contraponto a este nível estonteante de conhecimento que o homem vem alcançando estão suas mazelas, que em ritmo diretamente proporcional crescem vertiginosamente. Na ânsia hedonista da satisfação material a qualquer custo, o ser humano esquece de cultivar os bons instintos, robustecer o espírito e exercitar a solidariedade, o que torna aqueles adventos mais parecidos com peças de reposição de robôs.
Ingressaremos no 3º milênio falando em tempo real com nosso semelhante a milhões de quilômetros por intermédio de um aparelhinho que pesa 100 gramas ou em frente a uma telinha de uma polegada, mas vizinhos de quintal ainda se matando pela falta de comunicação que objetivasse reverter o ódio ferocíssimo oriundo das contendas religiosas, territoriais e políticas; conduziremos seres vivos clonados, fruto da mais avançada tecnologia, mas sujeitos a padecerem de tantos males (alguns tão prosaicos como um resfriado; outros tão insidiosos como o câncer e a AIDS), que tudo se torna obscuro, incompreensível.
Como dar a vida se não se pode mantê-la com boa qualidade? Em Terra Brasilis, a grande massa manipulada será conduzida ao século 21 por sua péssima classe dirigente com uma das rendas per capita mais iníquas e ridículas do Planeta e um padrão social calamitoso. Os pastores do rebanho, no entanto, saudarão o novo Milênio com as bochechas coradas pela dolce vita e a demagogia mais esmerada do que nunca, fazendo caras e bocas pelo paroxismo da generosidade em conceder R$ 30 de reajuste no salário miserável, suficiente para preservar a força de um dedo para teclar uma urna, que é só no que pensam.
Saudações ao novo Milênio; é uma lisonja ser a nossa geração a pioneira em conhecê-lo. Se o faremos honrosamente ou não é controverso porque relativo. Depende do ponto de vista de cada um.
Publicado em dezembro/2000



