Ídolos

No princípio os humanos adoravam ídolos de barro ou de metais. Depois passara a venerar ídolos invisíveis e abstratos. E no momento presente observa-se a supremacia do culto aos ídolos feitos à sua imagem e semelhança. E a mídia, notadamente a eletrônica necessita freneticamente fabricar esses ídolos, sem o que sua existência estaria relegada a um plano secundário. Isto explica a razão pela histeria que acomete multidões quando morrem pessoas idolatradas ou quando deles nascem os filhos.
Muitos dos que se consternaram ao exagero pelo falecimento do jovem cantor Leandro, da dupla Leandro & Leonardo, e de tantos outros artistas e figuras populares não o fariam com tamanho fervor até mesmo no caso do passamento de parentes diretos. É porque estes são pessoas comuns e aqueles, mitos indeléveis nas mentes alienadas pela maciça e muitas vezes imerecida glorificação pela indústria da comunicação de massa.
Veja-se o caso da recém-nascida primogênita da apresentadora Xuxa: a começar pelo nome, de forte apelo publicitário (não sei se deliberadamente ou não), foi imposta à menina uma mitificação mesmo antes de vir ao mundo, não importando se ela haverá de querer conviver no futuro com esta honorificação que poderá tornar-se um estigma para ela, a depender do desenrolar de sua personalidade.
O certo é que a indústria não poderia desprezar tão potencial projeto devido ao invejável “pedigree” da pequenina Sasha, o que torna a tarefa do endeusamento muito mais fácil e garantida, afiançando a oferta de ídolos para uma demanda sempre crescente. O problema é que a pressa de produzir a fim de calar essa insaciável demanda muitas vezes fabrica produtos de qualidade duvidosa, e o mais grave: ao se venerar à exaustão um outro ser humano igualmente vulnerável e com as fraquezas inerentes propositadamente ocultadas, a sociedade tende a esquecer outros valores mais verdadeiros e autênticos, causando o desequilíbrio e o equívoco nas relações humanas.
Bem-vinda, Sasha. De antemão, escusas pela nossa hipocrisia.
Publicado em agosto/1998