Aqui eu guardo meus escritos.

Obrigado pela visita.

Natal e hospital rimam. Ou, notas pessoais nevoentas na transição 2002/2003

Não sei o que há comigo, mas não gosto de natais. Em todos fico deprimido e encaro os rituais de forma mecânica e por honra da firma, ou melhor, da tradição, que não é de bom alvitre contrariar. Este, no entanto, se superou em me deixar melancólico. Uma manchinha vermelha na perna direita apareceu no dia 22/12, do tamanho da cabeça de um alfinete, e, pequerrucha infausta, tive de me internar no São Vicente dois dias depois com prognósticos sombrios e cenho franzido do médico. A cabecinha de alfinete se transformou em 48 horas numa ferida com o diâmetro de uma moeda de R$ 0,25, preta que chegava a reluzir, irradiando uma onda vermelha de irritação (princípio de erisipela, me disseram) que ia do joelho ao pé. A ferida podia ulcerar e permanecer aberta por todo o sempre, lembrando as de alguns pedintes que ao menos encontraram uma forma de lucrar com a própria desgraça.

Fiquei eu, então, ouvindo ao longe os sinos pequeninos de Belém num quarto do São Vicente, muito bem assistido e dignitário das melhores atenções e dos mais eficazes antibióticos, pensando com simpatia incomum no chester e nas rabanadas. Em dado momento recebi a visita do amigo Damoita, ex-jogador de futebol que, pelo uniforme de prisioneiro e um cabo de vassoura ao ombro sustentando um frasco de soro logo compreendi que também era vítima de uma maldição em forma de grave crise vesicular.

Saímos ambos a tempo de comemorarmos em família a passagem do ano, devidamente curados e sinceramente determinados a nos livrarmos enfim de nossos vícios (eu, do cigarro, ele, da bebida.) Estou há mais de mês sem nicotina; ele assegura estar pelo mesmo período sem o álcool. E certamente nossos natais, daqui em diante, terão um colorido mais especial, espero.

Publicado em janeiro/2003