Aqui eu guardo meus escritos.
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Ela era jovem, rica e bela. E nada de paranoica ou débil mental. Mandou matar os pais por um louco amor, formando um drama real que supera as fictícias tragédias shakespearianas no ápice do delírio criador do dramaturgo imortal.
Que motivo é esse? Como o amor pode ser tão mortífero? Na impossibilidade de uma análise psicológica de mais profundidade, resta a impressão de que a juventude da era moderna não tem limites para nada, e que numa sinistra ironia os pais de Suzane Richthofen foram culpados de certa forma pela própria tragédia que os vitimou, já que vivenciaram e praticaram as regras de comportamento ditas modernas.
O poder material destes trevosos tempos passaram a ser o único valor a nortear grande parcela de seres humanos. Conforto, consumismo, luxúria, hedonismo, peitos siliconizados, bundas proeminentes substituíram dignidade, moral e solidariedade. E esta cultura é transmitida dos pais para os filhos.
A evolução comportamental sempre foi vista com reserva. Como se escandalizaram, por exemplo, os pais da juventude transviada da década de 1960 com as barbas e os cabelos compridos de seus filhos, ausência de banho, sexo livre e a consagração da utopia de um mundo sem peste, fome e guerras. Mas aqueles pais, embora tivessem o dissabor de testemunhar a ruptura de um padrão estabelecido, o que é sempre traumático, tiveram atenuantes em relação aos de hoje porque os movimentos de outrora tinham o Paz e o Amor como abordagem principal.
Atualmente imperam os pit bulls, os robôs sem alma e sem coração forjados nas academias de artes marciais, os pequenos tiranos que por terem tudo julgam que a tudo podem, até incendiar pessoas em praça pública, assassinar garçons, matar espectadores no cinema e assassinar os pais.
Os meios de comunicação, em especial a TV, têm enorme parcela no atual padrão estabelecido. A televisão brasileira vem formando uma geração com mutações genéticas que a torna dependente de violência e notícias ruins. A diversão dominical é exatamente achar graça na desgraça alheia, rir-se à toa de tombos e tropeções nas famosas pegadinhas. Os comunicadores, na mais desavergonhada ironia mostram que as pessoas que ainda têm bom coração e se dispõem a ajudar o próximo não passam de um bando de otários, que trocam pneus e são zombados, ajudam deficientes físicos que levantam e saem andando, e tantas outras situações criadas para expor as pessoas ao ridículo, destruindo o balizamento da ética e da razão.
O amor de Suzane é fruto dessa poção diabólica, cozida no caldeirão da permissividade, da dissimulação, da insensibilidade, da crueldade, da impiedade, da iniquidade. O ápice deste amor para quem nunca conheceu limites teria de ser lavrado num clima de erotização maior imaginado por suas mentes frívolas: o sacrifício dos próprios pais de um dos parceiros!
Publicado em dezembro/2002

Começo este amargurado artigo evocando Castro Alves em seu célebre poema Vozes D´África: “Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes? Em que mundo, em que estrela tu te escondes, embuçado nos céus?”
O fatídico 11 de setembro jamais será esquecido, no qual tivemos a forte impressão de termos sido definitivamente desprezados pela Potestade. Será por todo o sempre o capítulo mais tenebroso da história da humanidade, sem ocorrências precedentes nem pósteros. O furor do ódio materializado no paroxismo da insensatez e da loucura ficará impregnado nos recônditos mais longínquos deste nosso Planeta, que de um azul vistoso transformou-se rubro pelo mar de sangue de dezenas de milhares de inocentes, e da vergonha perante o universo.
Foi uma tragédia largamente anunciada pelas divergências inconciliáveis que nos assolam. E outras virão porque chegamos a um tal nível de intolerância que qualquer gota transborda e causa efeitos devastadores, inacreditáveis. O fanatismo religioso, o preconceito racial, as diferenças políticas aquecem-se de forma incontrolável e chegam com facilidade ao ponto de ebulição. Tal qual determinados tipos de bactérias e vírus, o ódio, este sentimento pernicioso, intrinsecamente humano, reproduz-se de várias formas e tem a faculdade incomum de dotar-se de criativos mecanismos de autopreservação que tornam inúteis todas as tentativas de combatê-lo. E quando a ele se une inteligência, ousadia e o desprezo pla própria vida, tudo parece irremediavelmente perdido.
O ódio racial, o ódio político, o religioso, o social, em todas as suas modalidades e diferentes formas e sutilezas é sempre mais destrutivo e gera-se na ignorância e no egoísmo desenfreado que parecem ter atingido o ápice em nossa contemporaneidade. O crescimento inversamente proporcional de sensatez em relação a insanidade, de estadistas em relação a oportunistas políticos, de pastores em relação a vigaristas contribuem para a implementação deste subalterno sentido com toda a virulência que lhe é inerente. A carnificina de Nova Iorque no 11/11 não supera em números absolutos as das grandes guerras e outros holocaustos humanos, as com certeza será lembrada como a mais chocante de todos os tempos pela desvairada devastação num único dia!
E dela fica tão-somente a esperança de que não seja o início do fim, e para tanto façamos nossas as palavras do poeta: “Não basta inda de dor, ó Deus terrível?! É, pois, teu peito eterno, inexaurível de vingança e rancor?”
Publicado em setembro/2001

Triste sina a de quem, como eu, fica dando tratos à bola em frente a um computador na vã tentativa de despertar o interesse dos parcos leitores, escrevendo palavras que incapazes de franzir levemente o cenho daquele mais atencioso. Além de não conseguir pegar o jeito da coisa, que é mais ou menos como a música (já se nasce com o dom), escrever por estas plagas tem vários complicadores, a começar pela falta do que dizer.
A conspiração contra o cronista do interior já começa no fato de que poucos brasileiros têm o bom hábito da leitura. No interior é pior. Um contingente maior sequer soletra corretamente uma palavra, enganando-se quem julgar que estes só pertençam à classe social menos favorecida. O deleite da desforra de uns ricos obtusos contra mim é que, se soletro corretamente, em contrapartida mal me recordo da cor de uma nota de R$ 100 e inexoravelmente jamais serei um político.
Mas a vida teima seguir e como disse o poeta, navegar é preciso, ainda que por sobre as águas sonolentas deste mês de janeiro, carregando quase à deriva um barco meio sambado que leva a bordo um timoneiro trôpego e indiferente, acometido por ressacas inimagináveis. A veia literária que alguns tentam me convencer que é boa (apesar de apresentarem só provas circunstanciais) parece ter entupido, vitimada pelo golpe de misericórdia desferido pelas incríveis bandoleiras comilança e bebelança que nos vitimam todos os finais de ano, sem dó nem piedade.
A coisa é tão séria que em meio às últimas ceias magnificentes de Natal e Ano Novo, emolduradas por vinhos, espumantes e destilados de inúmeros paladares e variados matizes, me surpreendi em delirantes devaneios sobre o delicioso e saudosíssimo sabor de um bom angu com taioba, um trivial ovo frito e prosaicos sucos Maguary como complemento.
Todo ano é a lesma lerda, como diz Carlito Maia. No início de todos eles sempre me prometo que em dezembro desconecto-me do sistema, dou-lhe uma banana e desmascaro de vez Papai Noel, provando por A mais B que ele não existe, deve ser fruto da invenção de algum sabido comerciante preocupado com o encalhe de suas bugigangas. A partir de novembro, porém, sempre caio na real e sinto como é difícil fugir deste rolo compressor de cuja competência mercantilista me faz retomar a simpatia pela figura etérea do bom velhinho, e me surpreenda em passos furtivos madrugada adentro nas vésperas do Natal depositando pacotes em cima de sapatinhos estrategicamente colocados nas janelas.
Mas do que estava eu dizendo era da falta de assunto. Ela é tanta que deu até assunto, veja só. Quisera poder articular neste espaço temas mais interessantes e proveitosos, mas como, com a veia entupida? Quisera inclusive comentar quão animado foi o fim de 1999 em Bom Jesus. Todavia, penso: que fim de ano? Acaso tivemos um por aqui?
Vai ver é porque o mundo acabou mesmo e eu não me dei conta disso em outra dimensão onde provavelmente me encontre, e tudo tenha saído de minha imaginação agora eterna. Neste caso eu nada escrevi neste espaço e você nada leu, o que, na realidade terrena daria tudo rigorosamente na mesma.
Publicado em janeiro/2000

Os escritos sem a identificação dos autores — folhetos apócrifos — têm sido largamente utilizados nas duas Bom Jesus, fato decepcionante e que traduz o baixíssimo nível moral e intelectual de quem os produz. Nem sequer uma palavra como comentário tal prática mereceria, não fossem estes dementes presumivelmente bom-jesuenses, e, pior, mais presumivelmente ainda detentores de algum vínculo com a política local.
Nossas duas cidades, pacíficas, pacatas e que nos fornecem a possibilidade de uma vida contemplativo não merecem que gente dessa laia desfrutem de sua hospitalidade. Muito menos os cidadãos ordeiros, que temos sério compromisso com a ética, com a boa educação, com a elegância e com o respeito que deve prevalecer entre os membros de uma sociedade civilizada podemos aceitar pacificamente que nossa identidade seja respingada pelos dejetos dos que rastejam nos porões taciturnos da maledicência.
Estes se acostumaram a chafurdar na fossa abissal da ignorância, do desprezo, da deselegância, da irracionalidade, vítimas, pobres coitados, da falta de um berço decente ou de um banco escolar. Acima de tudo são covardes, que se escondem no sigilo traiçoeiro para denegrir invariavelmente pessoas de bem, pessoas realizadas e bem resolvidas nos planos pessoal e profissional exatamente porque o sucesso destes é intolerável às suas bisonhas capacidades, aos seus ridículos projetos, à sua insignificância mental.
É de estarrecer que políticos necessitam, recrutam e até mesmo garantam boa vida a este refugo social para lhes confiar o serviço sujo que não deveria existir, escalá-los para as tramoias e escaramuças explícitas e a tudo o que de pérfido existe no sistema falido e desmoralizado da política brasileira. A escoalha faz bem esse serviço. Rasgar bandeiras e galhardetes do adversário, intimidar pessoas humildes, agredir, espionar, rosnar, injuriar, caluniar, difamar são suas especialidades. São totalmente desprovidos de amor-próprio, respirando mediocridade por todos os poros; é gente amargurada, ressentida, às vezes em conflito consigo mesma porque constituídas da mesma estrutura de um ser humano, mas lhes falta o caráter, a integridade moral para se portar como tal. Isto é terrível para o seu íntimo, para o seu inconsciente, porque não podem sair por aí andando na horizontal através dos quatro membros.
Da aliança de nossa indignação depende a caça aos vermes que deixam seu rastro excrementício a vitimar um ou outro incauto o que, para a aberração de sua natureza ignóbil, com os seus vis objetivos, já é um lucro extraordinário.
Publicado em janeiro/2001

Pode parecer piegas utilizar a imagem de uma mãe sofrida em meio a um ambiente festivo, mas o objetivo é forçar uma reflexão coletiva a respeito dos contrastes sociais em que o mundo é forjado, e nada melhor que fazê-lo justamente, e por ironia, nos momentos em que a humanidade comemora exatamente o nascimento de uma criança humilde, carente e sofrida que veio ao mundo padecer em holocausto o preço da salvação dos homens, segundo os religiosos.
Reparem no olhar dessa mãe. Observem seu semblante desiludido e desesperançoso. Quem, senão os insensíveis, não haverá de se deixar dobrar pela emoção ao tentar entendê-lo? O mundo egoísta, opressor e tirano não poderia ser tão selvagemente cruel a ponto de tripudiar assim, mostrando-lhe sonhos que jamais poderão ser realizados. Que conjunção de astros ou conjugação de fatores poderão dotar uma mãe do entendimento e da compreensão para as injustiças que lhes são impostas sem piedade, mais dolorosamente a seus filhos?
Conforme disse o poeta inglês William Wordsworth, “a criança é o pai do homem”. E essa criança no colo, certamente, é mais uma semente que não germinará de forma ideal pois semeada em solo contaminado pela brutalidade das injustiças que a impedirão vicejar uma infância sadia e feliz.
Que perguntas esse olhar amargurado formula? Que compreensões deseja obter? Seria talvez sobre as razões de se comemorar com tanta pompa e circunstância nesta época o nascimento de uma criança que viria a condenar veementemente a subjugação do homem pelo homem? E o porque de alguns o comemorarem ostentando acintosamente a fartura e o poder material? Este olhar, ao fitar o nada, certamente traduz involuntariamente o resultado da incompreensão sobre a existência de amor e carinho para alguns, indiferença ou ódio para si; castelos e mansões num lado, favelas e cortiços pestilentos e promíscuos a abrigar sua infeliz matéria, de outro; farturas gastronômicas de variados paladares e matizes noutras mesas, e na sua um ralo mingau de fubá raramente complementado com um naco de salame de qualidade duvidosa.
Quanto equívoco. Será que não percebemos que os mimos ofertados ao Menino Jesus pelos Reis Magos não teriam sido um simbolismo de amor ao próximo? Não teria sido uma senha acenada há 1997 anos para demonstrar aos mais afortunados a não deixarem desamparados e ao relento os que nada têm?
Atentemos a este olhar tristonho não identificado individualmente, mas semelhante a milhões de outros merece. Ele merece ao menos uma prece. Se possível, um pouco de indignação.
Eras tu, Senhor?
Publicado em dezembro/1997