Aqui eu guardo meus escritos.
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Parecida com um trecho do poema “pneumotórax”, de Mário de Andrade, a frase-título acima traduz as circunstâncias políticas, sociais e econômicas de Bom Jesus/RJ desde um passado já longínquo. Fora a Estrada de Rosal, feita pelo Estado e inaugurada em meados de 2004 (rodovia que o bom-jesuense aguarda há meio século), e um ou outro benefício pontual, esporádico, nada de mais consistente tem acontecido por estas bandas desde 20, 30 anos atrás.
Incrível, incompreensível, desconcertante, perturbadora a sensação de que cidadãos e cidadãs “determinados” na política local rareiam como um Stradivarius já há muito e tenebroso tempo. Determinados, quero dizer, em não permitirem que seus interesses próprios se sobreponham aos da coletividade; determinados na coragem, no destemor de enfrentar lobbies e interesses subalternos dos que agem em detrimento da massa; determinados em evitar marolas, frases de efeito, discursos hipócritas, cabotinice, mostrando o amor que sentem por sua cidade com atos, atitudes e ações objetivas, arrojadas, transparentes e criativas, e não com os velhos clichês das manjadíssimas dissimulações; determinados em liderar, na verdadeira acepção do termo, que se traduz no talento e na vocação de convencer, mobilizar, unir e harmonizar em prol do bem comum; determinados em por o dedo na ferida e, sem se acovardar, apontar problemas e dar os nomes de seus causadores; determinados em sentir vergonha, pejo, indignação e revolta com a situação atual de seu município, que não bastasse estar no fundo do poço público-gerencial, uma pequena parte de seu estrato social falida moralmente contribui para desonrá-lo ainda mais, conspurcando seu slogan oficial ao transformá-lo em “é ‘ruim’ viver aqui”.
A portentosa “Operação Epidemia” deflagrada pela Polícia Federal, que prendeu 31 pessoas e deixou quase 2000 de cabelos em pé pela ameaça de investigação de suposta fraude contra a Previdência Social foi como a laje no sepulcro. Das barrancas do Amazonas aos Pampas gaúchos, Bom Jesus foi retratado em horário nobre como um lugar marginal, no qual um em cada 10 beneficiários do INSS teria obtido suas benesses de forma ilegal. Daí a tarefa de ressuscitação de seu organismo público se tornar ainda mais árdua, mais extenuante, porque será preciso restaurar para além da capacidade organizacional e financeira o amor-próprio de uma população apática, cuja capacidade de reação desvanece-se mais profundamente quando percebe que não é espoliada moral e economicamente apenas por políticos desonestos.
O quinto prefeito da gestão 2005/2008 tomou posse em 29/6. Haverá um sexto? Pelo pique da remada pode haver, Perfeitamente. Nada mais parece causar espécie. Ser prefeito aqui está se tornando o mesmo que ser padre no inferno. E o porquê desse sortilégio numa cidade brasileira como outra qualquer, mas que ao contrário não cresce nem se moderniza, ainda que receba até royalties do petróleo sem produzir uma gota sequer do ouro negro? Será que, como a tuberculose do poeta, a única coisa a fazer é tocarmos (sobretudo, dançarmos) um tango argentino?
Publicado em junho/2008

Como num jogo de futebol que o presidente Lula tanto aprecia, os primeiros quinze minutos é o chamado tempo que os adversários se estudam mutuamente, e a partir daí imprimem toda a força adaptando o talento e o vigor naquilo que consideram pontos fracos do contendor. O governo do PT, que teria vindo para sacudir as estruturas e implementar projetos pretensiosos de cidadania, visando resgatar a dignidade dos brasileiros está exagerando esse tempo. O próprio PT já admite que o chamado “espetáculo do crescimento” será iniciado somente em 2004, isto é, perdeu-se 25% do tempo precioso, que voa, falando palavras de efeito e chorando lágrimas de emoção, porém sem nenhum benefício prático.
O PT malhou muito as doutrinas divergentes como estratégia propagandista, mas convergiu, entregou-se facilmente às linhas pragmáticas do modelo que tanto combatia. O resultado, que era de esperar, foi pancadaria por todos os lados. Engrossam o coro dos insatisfeitos políticos de fora e os de dentro do partido, e até de velhos companheiros de Lula. É crise da Saúde, da bancada radical, da questão agrária, do loteamento dos cargos, do ministro do STF que aponta czares no Planalto e, a mais recente delas, a do senador Eduardo Suplicy, que endossa tudo.
A artilharia pesada que o governo enfrenta é o preço que o PT paga por ser incoerente, aplicando agora a cartilha que tanto condenou em governos predecessores, especialmente nos do ex-presidente FHC. É sintomático que o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, considerado por Lula e pelo PT como “gênio do mal” em tempos nem tão longínquos, faça agora rasgados elogios à política fiscal petista, absolutamente recessiva, imobilizadora a quaisquer movimentos de progresso, mel da especulação.
No lugar do espetáculo do crescimento o que se viu foi uma série de denúncias de fisiologismo no governo, a distribuição indiscriminada de cargos onde as palavras qualificação e competência foram relegadas a um plano secundário. “Nada pode ser mais nocivo do que converter o cargo técnico em recompensa”, afirma o cientista político Helio Jaguaribe. A oposição tucana denuncia que sete em cada dez postos de confiança do governo estão sendo ocupados por aliados que nem sempre atendem aos requisitos de competência. “Os críticos estão certíssimos em bombardear esse loteamento”, conclui Jaguaribe.
O desgaste atingiu em cheio o partido que sempre condenou o fisiologismo. As lágrimas vertidas por Lula por ser solidário e sensível ao flagelo econômico e social de seu povo não podem ser um fim em si mesmas. Ato seguinte a elas é necessário dirigir também o sorriso das hienas aos conspiradores da causa que o levou ao poder. Será uma tragédia para o povo se o presidente se acostumar ap status quo e suas lágrimas um dia vierem apenas e tão-somente pela emoção oriunda das músicas de câmara em Paris.
Publicado em outubro/2003

Esta frase, vista num para-choque de caminhão, traduz uma verdade. Com efeito, os adeptos da distribuição das benesses eleitoreiros, aqueles que compram o eleitor com favores os mais variados certamente não fazem à própria expensa, e a torpeza desses procedimentos reside no fato de que as pessoas acabam pagando a conta, de uma ou outra forma — com juros extorsivos, pois a recuperação dos “investimentos” normalmente é à custa do seu emprego, da sua saúde, da sua educação, da sua dignidade, enfim.
Por outro lado, há, sem dúvida, os políticos que compram, sim, não no sentido pejorativo, não na oferta de agrados ou favores rapidamente transitórios e de efêmera valia, mas com ideias, com planos, com sabedoria e sincera vocação de bem servir ao país. O diabo é que está difícil identificá-los. O modelo político que aí está prostituiu-se a tal ponto que levou de roldão a capacidade de discernimento do eleitor. De há muito que partidos deixaram de ter programas ou ideologias para se dedicarem quase que exclusivamente a finórios balcões de negócios, com o entra-e-sai de filiados ao sabor de interesses estritamente pessoais.
As agremiações partidárias, ao se desmoralizarem desta forma, perderam a credibilidade de respaldar nomes, nivelando por baixo todos os candidatos que, num verdadeiro salve-se-quem-puder individualista enfatizam suas qualidades pessoais que soam ao eleitor como demagógicas e falsas, numa interpretação coletiva às vezes injusta e que só faz realimentar o círculo vicioso. Esta situação persistirá até o momento em que a prática do exercício da democracia possibilite aos brasileiros acertarem intuitivamente, escolhendo aqueles que possam reverter esse quadro caótico, contraproducente e danoso aos interesses do Brasil, e oxalá possamos contemplar o primeiro passo emergir das urnas este ano.
Publicado em setembro/1998

O recente arranca-rabo envolvendo os senadores Antônio Carlos Magalhães e Jáder Barbalho dá bem a tônica da moral e dos bons costumes que permeiam a personalidade de boa parte dos políticos do mais alto clero deste país. Os dois maiores caciques digladiam-se com palavras que fazem corar o mais obtuso dos cidadãos, envergonham o mais salafrário dos vigaristas, ruboriza a ralé dos indignos.
Mas eles são excelências, ora bolas. E apesar dos xingamentos serem a vero, fica parecendo mais coisa de excêntricos, um capricho de milionários, que não tendo mais nada a conquistar no terreno pessoal (já que têm tudo o que querem), resolvem se divertir acirrando mutuamente as adrenalinas. Para os simples mortais, no entanto, é caso sério. Começa pela desilusão de saberem que sua vida é influenciada intensamente por gêneros dessa estirpe, que sua mais alta corte legislativa bem parece a casa da mãe Joana, e culmina com a tristíssima constatação de que os senadores ali estão para realizar o inimaginável, menos trabalhar pelos interesses do Brasil e dos brasileiros.
Quando duas prostitutas disputam a tapas o mesmo cliente, se agridem com palavras de baixo calão e perdem ambas chumaços de cabelos, a cena é deprimente, mas não causa maiores dissabores senão a elas próprias, evidentemente. Quando vossas excelentíssimas não economizam nos adjetivos que exprimem os piores instintos humanos, com a palavra ladrão se banalizando a tal ponto que chega a ser quase um elogio, aí quem se ferra é o povo porque sabe-se que neste débil país tudo oscila no humor dos seus políticos.
Fico com as prostitutas.
A briga particular dos dois bólidos não seria nada tão assombroso, não restasse a dúvida: e se ambos estiverem certos? Se são realmente, como eles próprios se acusam, ladrões, salafrários? Como é que fica? Veremos suas fotos estampadas em cada poste com a inscrição “procura-se”? Existirá alguém na face da Terra que ousará intentar ações jurídicas que os destronem dos respectivos reinos ricamente ornamentados com o sacrifício da imensidão de pessoas que vivem na fronteira da desesperança? Francamente!
Arnaldo Jabor não exagerou quando disse: “eu presenciava a baixaria dos dois brigões, com ladrão daqui, fujão dali, quando uma barata se aproximava dos meus pés. Pensei em esmagar bicho tão asqueroso, mas resolvi poupá-la porque é preciso que viva alguma coisa natural e pura neste Senado”.
É o cúmulo do escárnio para com o povo sofrido e desesperançado. Para quem tem vergonha na cara e apesar dos pesares ama o seu país, cada ofensa trocada entre membros de uma instituição como o Senado Federal, a mais alta corte legislativa e que teoricamente simbolizaria o equilíbrio, a tolerância e o fair play entre seus membros, dói na alma. Cada palavra de baixo calão que de lá se ouve é como um objeto pontiagudo ferindo de morte o lábaro que ostentamos estrelado, é a dignidade pública violentada, a desilusão consolidada.
A se confirmarem as denúncias, fica o gosto amargo da constatação de quão putrefatas se encontram as instituições brasileiras e a sensação de que a única solução para o Brasil seria uma faxina geral do sistema viciado que aí está, com o extermínio das ervas daninhas que impedem o florescer do otimismo e da esperança.
Publicado em dezembro/2000

É impressionante a fragilidade dos nossos planos econômicos. À exceção do Real, todos os seus predecessores sucumbiram fragorosamente nas primeiras dificuldades, onde alguns não chegaram a 90 dias de vigência. O próprio Real, que se mostrava eficaz contra a mais terrível geradora das injustiças sociais — a inflação, já não se sente tão seguro à mercê dos especuladores, as turbulências do momento. Os motivos para essa fragilidade a gente sabe, e sem querer entrar em minudências pode-se resumir, convictamente, que é ocasionada pela negligência dos políticos que tergiversam quando convocados a deliberar sobre as reformas imprescindíveis para a sustentação da estabilidade monetária.
Sem essas reformas, quem tem a obrigação de proteger a moeda contra os especuladores é exatamente — até quando? — os que não a possuem. Ou a recessão, a estagnação e o desemprego não atingem somente a população pobre? A minoria abastada, apesar de também sentir um certo desconforto em relação à sua qualidade de vida não sofre tanto, uma vez que sempre encontra mecanismos de proteção. Toda vez que um burocrata da economia pega da caneta e rabisca seu jamegão autorizando a elevação dos juros, especialmente um aumento brutal como este mais recente, interfere imediatamente no feijão-com-arroz do pobre. E estas intervenções ou outras modalidades ainda mais perversas sempre ocorrerão em economias instáveis à medida da oscilação do bom humor internacional.
Se Bill Clinton acordar mal disposto, se Hussein resolve brincar de jogos de guerra ou se os tigres asiáticos num belo dia decidirem regredir à infância e virar gatinhos, nosso frágil e incipiente Real sofre as consequências, ou melhor, quem não os tem nem nunca teve. Acorda, Themer! Acorda, ACM! Acordem todos vocês, políticos, do sono da inércia, da veleidade e da incúria. Esqueçam por um momento seus interesses pessoais e pensem no Brasil como um todo. Consolidem definitivamente nossa economia, protejam-na contra a pirataria, dotem-na de estruturas que a façam segura por si só.
Feito isto, teremos dado um grande passo no sentido de dificultar, ou mesmo impedir, que um Nahas qualquer possa reduzir ainda mais os já escassos grãos de cereais que ainda conseguem impedir, a duras penas, o roncar dos estômagos de uma considerável parcela de compatriotas.
Publicado em novembro/1997