Aqui eu guardo meus escritos.

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Farrapo Humano. Bebida alcoólica entre crianças e adolescentes é um tormento para eles e mais um punhado de gente que gravita em sua órbita

Quem transita na passarela que une os bairros Lia Márcia, em Bom Jesus do Itabapoana, e Silvana, em Bom Jesus do Norte, pode verificar uma norma que “pegou”: ciclistas e motociclistas, salvo um ou outro mais mal-educado atravessam o rio empurrando seus veículos, mesmo agora que é raro encontrar um policial na cabine do lado fluminense (no capixaba, nem cabine existe). Outra lei que também “pegou” foi a da obrigatoriedade do uso de capacete pelos motociclistas.

No entanto, a que limita o tempo em que se fica nas filas dos bancos, e a que proíbe a venda de bebidas alcoólicas a menores…, estas…, nem que ainda haja juízes em Berlim! O consumo de bebidas alcoólicas pelos brasileiros atinge proporções de drama. Um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) diz que o consumo de álcool no país aumentou 154% entre 1961 e 2000, e estudos mais recentes apontam tendência de alta. Mas o drama maior, que beira o desespero está no consumo entre a juventude brasileira. Uma pesquisa do Senad (Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas) aponta que o consumo regular de bebidas é mais frequente entre adolescentes de 14 e 15 anos de idade. Isto ajuda a entender por que o Brasil se coloca entre os países com as mais altas taxas de homicídios e acidentes de trânsito do mundo!

Seria pretensioso de minha parte tentar me aprofundar nas causas deste comportamento, mais ainda se acreditasse na capacidade de fazê-lo com competência. Mas a inteira liberdade que o jovem tem de comprar e consumir bebidas alcoólicas, com certeza é uma delas. E mais: o garoto e a garota são estimulados por maciças campanhas publicitárias e até mesmo induzidos ao uso por parte dos adultos, inclusive no seio familiar. Em qualquer lugar em que haja jovens reunidos, em especial à noite, vê-se a orgia do álcool, que nos reclames é símbolo de charme, elegância, inteligência e sucesso.

Nas festas, como a última de Bom Jesus do Norte, a antologia das garrafas de mãos em mãos adolescentes é algo que deprime, entristece e angustia. Afinal, o futuro do país está nas mãos e nos neurônios dessa turma. Eventos temáticos nos quais a danosa substância é a vedete pululam por aí: Festa da lata, Noite do vinho, Festival do chop, etc, substituíram o apelo artístico, cultural, pelo etílico. Quero dizer, o jovem já nem vai àquela festa tanto por atração ao seu artista preferido, mas sobretudo para ficar bêbado.

As barracas exclusivas de bebidas proliferam como coelhos, e algumas se esmeram tanto na cada vez mais lucrativa atividade que até sites na internet se dão ao luxo de ter, como uma que se instalou na recente Festa de Bom Jesus do Norte. No cardápio desta, “delícias” como Capetão, Trifásico, Flamejante, Parafuso e outras sandices eram ostensivamente oferecidas.

“O alcool compromete seriamente o funcionamento do cérebro, as lesões são crônicas e o estrago é tanto maior quanto mais cedo se tenha adquirido o hábito de beber”, diz matéria da Revista Galileu, da Editora Globo, n° 107. E aponta que 50% dos acidentes automobilísticos fatais, 50% dos homicídios, 30% dos estupros, 25% dos suicídios e mais de 60% de casos de violência contra crianças são relacionados a bebida, além de alta incidência de hemorragias digestivas e traumas cranioencefálicos por quedas e acidentes domiciliares. A desagregação familiar, a procura por drogas ilícitas a partir da bebida alcoólica, as desavenças e as brigas em casa ou na rua, os comportamentos de risco como fazer sexo sem preservativos, desempenho sofrível na escola e tantas e tantas amarguras para si e para os outros seriam evitados se não houvesse o álcool a interceptar o caminho dos nossos meninos e meninas.

É proibido vender bebida alcoólica a menores; dá cadeia. A fiscalização tem de fazer o seu papel, que já será um passo para atenuar esta calamidade com cara de tragédia.

Publicado em maio/2007

Vergonha! As cidades de Bom Jesus sofrem pela desorganização urbana, descaso estético, pusilanimidade dos poderes públicos

É de doer nos olhos e na alma o visual dos logradouros das Bom Jesus (do Itabapoana/RJ e do Norte/ES), especialmente na periferia das cidades. Calçadas na plenitude de seu dever de ofício são casuais. Não raro viraram objeto de usufrutos particulares diversos, notadamente depósito de material de construção e até extensões dos mais variados ramos de negócios. Pessoas abandonam seus refugos nas ruas, nas praças, em qualquer lugar público sem o menor constrangimento. Entulho de obras, lixo, móveis e utensílios descartados são depositados a qualquer hora, em qualquer lugar, mesmo que o caminhão de recolha tenha passado alguns minutos antes. É um comportamento bizarro, incrivelmente banalizado, tal como as sórdidas bacias de excrementos de seus senhores que os escravos do Brasil Colônia despejavam em qualquer lugar pouco mais longe dos palácios, ou os penicos plebeus esvaziados diretamente das janelas de seus usuários, mal comparando.

A agonia estética e higiênica, de civilidade mesmo, em Bom Jesus, parece não sensibilizar suas autoridades. Não apenas as do Poder Executivo, e até com mais ênfase, como deveria, às do Legislativo, que têm o dever de legislar, fiscalizar e cobrar. Lamentavelmente, entretanto, ninguém move uma palha para tentar mudar os conceitos, não se ouve uma voz estridente, ninguém vislumbra que maciças campanhas de conscientização e advertência sejam necessárias. Todos parecem estar em estado de apatia, letárgicos, impassíveis a contemplar o visual e até o futuro das cidades rolando aparvalhados feito troncos de enchente. É a inação completa, coletiva, talvez com a vã esperança de que surja uma solução mágica que, mantendo intocadas a indulgência e a acracia, transforme Bom Jesus em cidades modernas, organizadas, atraentes. A quadratura do círculo!

Pela força da vontade o homem visitou a Lua seis vezes e está com um pé em Marte. A falta desta mesma vontade para outros fins edificantes é, por outro lado, uma de suas mazelas. No caso de Bom Jesus, une-se à penúria de dinheiro — embora muitas coisas básicas independam de recursos financeiros — e está pronto e acabado o cenário sombrio, desolador.

O arraigado ranço provinciano que mantém intocados usos e costumes de antanho reina soberano. Não se deve descontentar “eleitores” obrigando-os a desocupar os espaços públicos, exigir de muitos deles comportamentos civilizados quanto aos mais elementares deveres que devem ditar uma consciência sã. O cânone político daqui parece explicitar ser proibido contrariar interesses, mesmo que estes contrariem as boas normas de convivência agregada. Por exemplo: nenhum empresário, especialmente se for de alto coturno deve ser importunado se utilizar os logradouros como complemento de seus estabelecimentos. Ele dá emprego, gera renda, como se isso fosse salvo-conduto para desorganizar, emporcalhar, enfear e descaracterizar as cidades. Estas, que lhes facultam os lucros, nada têm em contrapartida senão a feiura, a sujeira e a desconsideração.

Enfim, os velhos cacoetes incoerentes com os novos tempos só podem ser banidos com idealismo, inteligência, coragem, independência, desassombro, honestidade de propósitos, pragmatismo e aversão à hipocrisia e à demagogia.

Quem se habilita?

Publicado em abril/2007

Bom para otário. Foi vender medicamento falsificado e se deu mal

Um cidadão de meia-idade chega numa farmácia e, um tanto constrangido, fala ao balconista:

— Estou precisando de algo…, como direi… algo assim… — fita meio sem graça o balconista e completa, de chofre: — bom para o entusiasmo, é isso, bom para o entusiasmo. Sabe como é…, essa vida que a gente leva…, preocupações…, problemas…

— Já sei, já sei, responde o mais que solícito balconista, todo gentileza, com um brilho de satisfação no olhar. — O senhor chega em casa cansado…, desanimado…, sem disposição para nada… acertei?

— Na mosca! É isso mesmo, desencabula o freguês.

E o balconista antegozando o lucro extraordinário da venda de produtos tão caros quanto inócuos, que não fazem nenhum efeito (os cognominados B.O. — bom para otários), incentiva o infeliz:

— Tenho aqui remédios que fazem verdadeiros milagres. Levantam até defunto.

— É do que preciso, anima-se o cidadao. — Ultimamente a patroa tem reclamado tanto…, coitada. Já carece de tanta coisa…, e até o que ela dava como certo pelo menos uma vez por mês …, diminuiu o tom da voz  — não estou conseguindo mais.

— Pois o senhor veio ao lugar certo. Vou lhe vender uns compostos que são tiro e queda. A patroa vai vibrar, e é provável até que ela passe a reclamar…, mas de excesso… — explica com um risinho sarcástico, dirigindo-se às prateleiras e voltando com uma pilha de caixas. — O senhor vai tomar…, presta atenção, este quando acordar, este de duas em duas horas, este antes das refeições, este ao se deitar, este, meia hora antes do… do…, pega pra capar…, este…

— Tudo bem, redarguiu o freguês, agora com uma voz mais grave. — Antes de eu levar os remédios, o senhor venha comigo assinar um B.O.

— Ahn? B.O.?

— Isso. Boletim de Ocorrência. O senhor está preso em flagrante por exercício ilegal da Medicina e por vender remédios falsificados — disse, mostrando-lhe a carteira de delegado de polícia.

Em tempo: o governo não gostou nem um pouco saber que alguns laboratórios tratam o povo como otário. É que o governo detesta concorrência.

Publicado em abril/2000

Contatos nada imediatos

Cabo Canaveral, Florida, Estados Unidos. Um brinquedinho que, para os padrões da Nasa dizem ter sido de baixo custo, mas que seguramente atingiu a cifra de milhões, decola com destino a Marte. Pathfinder, o robozinho simpático (foto), leva consigo as esperanças dos que almejam decifrar o enigma do universo e colher subsídios que possam lhes satisfazer a eterna curiosidade: há outros mundos habitáveis e/ou habitados?

Minha opinião é que não teremos tão cedo esta certeza, baseada na teoria de que ainda não estamos preparados para um acontecimento dessa dimensão. E a razão é apenas uma: não detemos o conhecimento total a respeito de todos os nossos problemas, ainda não aprendemos tudo sobre nós próprios, mergulhados em dúvidas e incertezas a respeito de nossa própria espécie. Então, como poderíamos entender e aceitar possíveis vizinhos intergaláticos?

Bem verdade que evoluímos muito, erradicamos alguns males que nos afligiam e consideramos ter atingido alto grau de conhecimento. Mas isso sob nossa ótica, sob o nosso ponto de vista. Quem sabe, para “eles”, ainda somos iniciantes? Ou quem sabe a arrogância dos humanos os levem a suspeitar de nossas reais intenções ao procurá-los, e por isso não dão as caras? Como poderiam entender um ser que concebe e gasta fortunas num brinquedinho operado por controle remoto, mas ao mesmo tempo permite que seu semelhante sucumba por inanição? Corno poderiam compreender a ambiguidade da criação de mecanismos que salvam e que matam? E a complexidade dos sentimentos terrenos, onde amor e ódio, solidariedade e egoísmo não encontram barreiras a separá-los?

Nossa maior dificuldade em mantermos contato deve ser exatamente esta. Se os ET’s são mais evoluídos que nós, deixar-nos-ão a sós como parte de uma ética que as espécies inteligentes têm, que é a de respeitar o próprio desenvolvimento dos demais até o ponto em que haja uma perfeita harmonia evolutiva que permita eventuais intercâmbios. E certamente os terráqueos estão longe de atingir o ponto de convergência com seres evoluídos. Quem sabe isso ocorra no momento em que pudermos, ou desejarmos, parar de destruir paulatinamente o nosso próprio Planeta? Ou quando pararmos de nos digladiar pelas vias de fato ou através dos nossos pensamentos? Ou quando atingirmos um estágio avançado de dignidade que nos permita repudiar com veemência as razões, os porquês a civilização tem de conviver com guerras, massacres, toda a sorte de tragédias promovidas por ela própria.

Resta-nos ainda muito por fazer. Precisamos descobrir a razão de certas incoerências, como por exemplo termos capacidade de ir a Marte, mas não a de descobrirmos a cura para muitas de nossas enfermidades, nem mesmo para uma prosaica gripe; se conseguimos criar mecanismos para a destruição da Terra, nosso próprio habitat, umas cem vezes, como não podemos exterminar reles insetos? Inventamos parafernálias que permitem falar com nossos semelhantes a milhares de quilômetros de distância, ao vivo e em cores, mas não descobrimos ainda uma maneira ideal de diálogo. Reproduzimo-nos de todas as formas, naturais ou artificiais, mas não encontramos uma fórmula eficiente que dê suporte à vida.

Tudo isso, talvez, tenha sido analisado para se traçar o perfil de um terrestre. E havemos de concordar que essa pode ser a razão pela qual adiam uma visita ou não formam um comitê de recepção. E bem provável, até, que o ET ‘s, em suas rusgas eventuais, desfiram o seguinte impropério uns aos outros: — Vá para a Terra!

Publicado em agosto/1997

Viagra; menos leite para mais crianças

Muitos gastam as parcas economias em bebida para afogar suas mágoas pela inapetência. Agora certamente os gastos aumentarão pela compra do remédio que os possibilitarão afogar também o ganso. Aí haverá uma contradição: faltará o mesmo leite para mais crianças.

A ser lançada em breve no Brasil, a nova droga que promete acabar com a impotência sexual masculina, e que causou furor nos EUA (cujo sucesso retumbante chegou a influenciar a bolsa de Nova Iorque), é a sensação do momento e tema obrigatório nas conversas de homens – em especial os quarentões do mundo inteiro. Numa roda de amigos aqui no meu bairro, por exemplo, a conversa ia tão acalorada e recheada de bons augúrios, que alguns mais açodados resolveram fazer brincadeiras com os caracteres do nome do tal remédio, produzindo os acrósticos abaixo. Vejam quão criativos!

Velhos
Infelizes,
Atenção:
Ganhastes
Renovadas
Alegrias!

E esta, aconselhando alguém que esteja tendo um caso…, digamos…, perigoso.

Verifique
Importância
Aprisionar
Gametas,
Reprimindo
Agravantes.

Teve até mesmo um poeta que começou a compor em voz alta sua obra literária, semelhante às de portas de banheiros públicos, especialmente de estações rodoviárias:

Vinha neste mundo tristonho,
Infeliz, sem esperança;
Apareceu a droga, e do sonho,
Guardarei feliz tal lembrança…

Mas antes de o poeta terminar de compor foi interrompido por um gaiato mais ao fundo que, com uma vozinha em falsete, completou:

Revogue seu sonho, Braguinha,
Agora sua mulher já é minha!

Era só o que faltava. Todos hipnotizados por um remédio! Fernando Henrique deve estar radiante. Não que necessite da droga, não sei, mas exceto pelas perspectivas cada vez mais sombrias de o nosso Canarinho conquistar o Penta na França, resta o milagroso Viagra como a única alegria dos brasileiros. E tal fato não é pouca coisa. Contribuirá para manter as ilusões de um Brasil melhor e mais fecundo (com muito trocadilho, por favor).

Publicado em maio/1998