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Trânsito precisa ser reformulado em Bom Jesus do Norte

Bom Jesus do Norte tem crescido de forma vigorosa nos últimos anos, mas sua estrutura viária pouco mudou. O comércio da cidade serve como parâmetro para aferição desse crescimento, significando que as atividades socioeconômicas no município foram dinamizadas, resultado natural de mais pessoas morando, circulando e fazendo uso dos espaços públicos. Seria desejável a estrutura do trânsito seguir a tendência de crescimento e modernidade, mas isso ainda não acontece por aqui. Sua avenida principal continua a receber a esmagadora maioria do fluxo da mesma maneira que em meados do século passado, quando o lugar era um pequeno e acanhado distrito e os poucos automóveis existentes, luxo de grã-finos que se deslocavam numa ruela de terra batida.

Em muitos trechos da avenida os pedestres são obrigados a disputar com os carros a pista de rolamento, porque as calçadas ou estão obstruídas ou inexistem. Outro ponto que congestiona e fica perigoso é na altura da área de lazer devido ao intenso movimento: trailers, parques e circos ali instalados atraem grande número de pessoas e de veículos, tornando difícil o tráfego em mão dupla, principalmente nos finais de semana.

No seu programa de governo para a gestão 2005/2008, o prefeito Ubaldo Martins disse que vai promover uma completa reformulação e modernização do trânsito, e certamente ele transformará a avenida principal em mão única. E tanto melhor se essa reformulação vier o quanto antes, pois da maneira como está não apenas potencializa o risco de acidentes, mas deixa a desagradável sensação de desordem, de provincianismo na má palavra, ofuscando as outras importantes conquistas públicas e privadas que a população vem gradualmente desfrutando.

Publicado em novembo/2005

Sem arcanjo e sem trombetas “…prevejo dias com o ventre da Terra à mostra, céu sem sol, chuva de bosta…” – Zé Ramalho

É mundialmente corrente a voz de que a Terra, quando destruída, terá sido num átimo, com o toque de dedos em dois ou três botões. Para quase sete mil pessoas que conheceram o pavor nas torres do World Trade Center, número este de aterrorizados que se pode elevar à quarta ou à quinta potências a se considerar filhos, esposas e maridos, pais, demais familiares e amigos das vítimas, que igualmente viram fenecer a vida, os toques dos dedos teriam sido melhor. Sete mil pessoas, seus ascendentes e descendentes, grosso modo a população inteira de Bom Jesus do Norte, de forma direta, e bilhões de seres pensantes sensíveis, que ainda reservam espaço para a piedade nos corações e nas almas, viveram um pesadelo que seguramente mudará o curso de suas vidas.

O que se pode tirar de útil dessa carnificina, dessa comoção interplanetária? De que serviu o sacrifício dos mártires do WTC e o de nossas consciências machucadas, atordoadas, da nódoa que se perenizará na história da vida humana na Terra por todos os séculos e séculos sem amém? Para os norte-americanos e simpatizantes nem mesmo o sabor da desforra, porque esta não subtrairá grande coisa de um inimigo que faz da própria morte a razão de viver. Por ironia, é provável até que a fanática teocracia da qual Osama Bin Laden é um de seus expoentes máximos tenha planificado esse desfecho final como a apoteose de seus planos, no qual os atentados não encerraram em si o objetivo maior, que seria o expurgo de existências atormentadas num sistema econômico e social ditado pelo que consideram como o Grande Satã. E essa espécie de solução final pode ter sido engenhosamente planejada para ser executada à expensa do próprio adversário cego de cólera e sedento de sangue, que moverá as peças do intrincado jogo exatamente na direção de seus objetivos.

Se essa hipótese é verossímil porque pode ter tido a iniciativa de quem desmistifica a morte e torna sem sentido as palavras imprevisível e imponderável — nada mais será — então por que fazer o seu jogo? Por que não mobilizar tamanho esforço e recursos para desfazer justamente as diferenças que levam a essas reações tresloucadas, na tentativa de restaurar o prazer da vida e da contemplação? Essa magnífica metamorfose, que teria como pedra filosofal a eliminação da opressão de todas as naturezas, em especial a econômica em todos os quadrantes é a única possibilidade de o Planeta não se tornar inóspito bem antes do que se imagina, porque se a fé numa divindade pode ter consequências de tamanha destruição, a falta dela pela sucessão secular de desesperança, de injustiça e de fome pode trazer danos e sofrimentos ainda maiores.

Que não seja preciso acionar os botões! Assim como Hollywood viu agora esgotadas as inspirações mais delirantes, é lícito acreditar em roteiros amenos também para a vida real, em que os valores como a moral, o respeito e a fraternidade sejam realçados em sobreposição à decadência do hedonismo, da empáfia e da ambição desmedida e criminosa. Quem tem fé, reze. Em nome dos mártires inocentes estupidamente interrompidos em seus sonhos e em seus projetos; em nome dos que estão na iminência de perdê-los e por nós todos, uma geração fadada a promover o retorno glorioso da era medieval e do primitivismo dos instintos se não puder contar com uma força superior que a guie pelas veredas do amor e da consciência.

Publicado em setembro/2001

“Tudo é relativo. Até mesmo a relatividade do Relativismo” – Roberto Campos

Lá se vai o 2º milênio. E cá estamos com o privilégio de transpormos a linha em direção ao 3º! O que levamos na bagagem? Será a nossa entrada carregada de triunfo ou pisaremos o tapete com os pés manchados de desdouros? Citando Roberto Campos (foto), “tudo é relativo. Até mesmo a relatividade do Relativismo”. Desde a conquista de um avançado nível da Ciência e da Tecnologia, ao espoucar de tiros e clarões de mísseis a denunciar nosso primitivismo, e, por conseguinte, uma grandessíssima incoerência, tudo parece efetivamente relativo.

Indicadores científicos levam a supor que em breve estaremos em condições de instalar barraquinhas em feiras-livres para a comercialização de órgãos do corpo humano. Um coração zero km, um fígado virginal para conduzi-lo ao encantamento dos primeiros teores de álcool, um pênis de tamanho e circunferência a gosto, até transplante de cabeça, que certamente poderá sair de fábrica com um narizinho aquilino, pomos salientes e par de olhos na tonalidade que se desejar já povoa a mente frenética dos cientistas.

Em contraponto a este nível estonteante de conhecimento que o homem vem alcançando estão suas mazelas, que em ritmo diretamente proporcional crescem vertiginosamente. Na ânsia hedonista da satisfação material a qualquer custo, o ser humano esquece de cultivar os bons instintos, robustecer o espírito e exercitar a solidariedade, o que torna aqueles adventos mais parecidos com peças de reposição de robôs.

Ingressaremos no 3º milênio falando em tempo real com nosso semelhante a milhões de quilômetros por intermédio de um aparelhinho que pesa 100 gramas ou em frente a uma telinha de uma polegada, mas vizinhos de quintal ainda se matando pela falta de comunicação que objetivasse reverter o ódio ferocíssimo oriundo das contendas religiosas, territoriais e políticas; conduziremos seres vivos clonados, fruto da mais avançada tecnologia, mas sujeitos a padecerem de tantos males (alguns tão prosaicos como um resfriado; outros tão insidiosos como o câncer e a AIDS), que tudo se torna obscuro, incompreensível.

Como dar a vida se não se pode mantê-la com boa qualidade? Em Terra Brasilis, a grande massa manipulada será conduzida ao século 21 por sua péssima classe dirigente com uma das rendas per capita mais iníquas e ridículas do Planeta e um padrão social calamitoso. Os pastores do rebanho, no entanto, saudarão o novo Milênio com as bochechas coradas pela dolce vita e a demagogia mais esmerada do que nunca, fazendo caras e bocas pelo paroxismo da generosidade em conceder R$ 30 de reajuste no salário miserável, suficiente para preservar a força de um dedo para teclar uma urna, que é só no que pensam.

Saudações ao novo Milênio; é uma lisonja ser a nossa geração a pioneira em conhecê-lo. Se o faremos honrosamente ou não é controverso porque relativo. Depende do ponto de vista de cada um.

Publicado em dezembro/2000

União comovente

A família Lesa (assim, com um ´s´ somente, entenderam?) era bem numerosa e bastante unida. Havia, nessa família, um sujeito esperto que conseguiu se eleger prefeito do lugarejo onde viviam, com o auxílio fundamental do candidato a vice, pessoa muito querida na comunidade. No dia seguinte ao pleito começou a pensar nos nomes para o secretariado. Chamou a esposa e começaram a trocar idéias:

— Dos Anjos, o que você acha da nossa sobrinha Ana assumir a Secretaria da Educação?

Maria dos Anjos não conteve uma exclamação de espanto.

— Ana Alfa Beta? Sei não… Ela já conseguiu tirar o diploma do supletivo de primeiro grau que vem tentando há anos?

— Claro, você não lembra quando ela nos pediu uma grana emprestada pra poder molhar a mão daquele cara que cuida dos diplomas? Ana hoje é uma das pessoas mais instruídas. Ela sabe até ler de carreirinha — respondeu o marido-prefeito.

— Bem, nesse caso acho um bom nome, e o fato dela não gostar de crianças não vai atrapalhar — concordou a primeira-dama.

— Então ta fechado. Vamos ver agora quem vamos colocar pra cuidar das finanças…, deixa ver…, que tal nomearmos o Palhares?

— O seu primo falido? — perguntou Das Dores, sentindo um calafrio de emoção. — Ótima ideia, completou, eufórica.  — Trata-se de uma pessoa que já tem muita experiência em finanças. Além disso é um injustiçado com esses planos do governo.

Ainda bem que o prefeito não desconfiou que por trás daquela defesa tão empolgada que a esposa fazia do Palhares, havia coisas. E continuava Dos Anjos a enaltecer o primo do marido-prefeito: — o armazém, a lojinha que vendia mercadorias importadas do Paraguai, a fábrica de bebidas que ele tinha em casa, tudo bem, faliram por falta de experiência, além do que ainda apareceu aquele vigarista que vendia os rótulos das bebidas por um absurdo. E continuava, cada vez mais romântica.., digo, enfática: — Mas a farmácia não! A farmácia faliu por culpa desse tal de Fernando Henrique com seu maldito Plano Real. Além disso, o Palhares não devia ter dado ouvidos àquele sujeito que vendeu a fórmula de antibióticos.

Incrível como o marido-prefeito coçava os sintomas nas laterais da testa, mas não percebia a causa. E a mulher continuava, frenética: — Tudo bem que são feitos de cogumelos, mas teria que haver o cuidado de não confundir com aqueles fungos de mijo de cavalo. Até hoje o seu Finadino não curou a tuberculose crônica. Mas como eu disse, a ideia dele ser o Secretário de Finanças é excelente.

E assim foram papeando, marido e mulher atentos para não esquecerem nenhum parente. Nomearam a cunhada dela, que havia trabalhado 10 anos antes como assistente de veterinária, para Secretária da Saúde. Na Agricultura, o próprio filho, já que viam nele um promissor agrônomo do futuro, pois ficavam encantados com a dedicação do rapaz em tratar umas estranhas plantinhas no quintal da bela residência. O fato de ser maconha pouco importava: o rapaz cultivava o verde, e não é isso o que vale?

E iam assim nessa acalorada conversa nepotista, sempre arranjando um lugar para um cunhado aqui, um irmão ali, não esquecendo de nenhum parente. Preencheram, inclusive, os cargos subalternos, pois a parentada era grande. Pronto, tudo resolvido, cada um ente querido com sua situação financeira normalizada (ao menos por quatro anos), marido e mulher deram por encerrada a conversa e retiraram-se para dormir. Quando estavam quase adormecendo, a mulher levanta-se de um salto, senta-se na cama e sacode vigorosamente o prefeito:

— BENNHÊÊÊ. Você esqueceu sabe de quem? De M-I-M! E eu? Não sobrou nada pra mim?

E o marido-prefeito responde, bocejando, já nos braços de Morfeu:

— Calma, mulher. É claro que não ia me esquecer da primeira-dama. Cada um dos nossos parentes destinará 20% do salário pra você, a título de “corretagem trabalhista”. E isto corresponde…, deixa ver…, a folha total dos contratados…, R$ 30 mil…, uahhh…, uhmmm…, vai sobrar… R$ 5 mil por mês, está bom?

— Ah! Assim ta bom. Mas vem cá, acho que você errou na conta. Vinte por cento de R$ 30 mil não dão R$ 6 mil?

— Sim…, mas você esqueceu que nem todos os funcionários são nossos parentes? Não tive que ceder algumas vagas de gari e zelador para aqueles pobres diabos vinculados ao meu vice? Afinal, na minha campanha, se não fosse ele, nós ó…

Publicado em novembro/1996

Amigos, eu vi

A nostalgia me leva a traçar um paralelo entre a vida contemplativa de antanho e a de hoje. Sou bom-jesuense de quatro costados; nasci, cresci e contribuí para a perpetuação da minha espécie neste querido Vale. Na época da minha juventude — décadas de 1970/1980 — meus patrícios eram mais alegres e descontraídos, mais humanos e solidários. Bom Jesus eram calmas, sem atropelos. Suas festas, de características próprias, eram sempre um marco em toda região. A tradicional Festa de Agosto atravessava fronteiras. Eram épocas memoráveis, onde aflorava o sentimento regionalístico dos que aqui tinham raízes e a admiração despeitada dos forasteiros.

Quem, da minha geração, não se alegrava com os filmes em cartaz no Cine Monte Líbano? Que não se recorda com saudades dos memoráveis jogos de futebol proporcionados pelos legendários clubes Olympico F.C. e Ordem e Progresso? Lembram-se quando jogavam ente si? As duas cidades se coloriam de branco, vermelho, verde e amarelo numa alegria contagiante! Bons momentos em que nadavam-se despreocupadamente nas águas ainda adequadas do velho e inseparável amigo Itabapoana. Aos aficionados da pesca, peixes em abundância. Épocas de gloriosos carnavais de rua com seus blocos irreverentes constituídos de foliões criativos na confecção de suas fantasias, a alegria serena nos salões, onde diversão não era ainda sinônimo de arruaças.

Amigos, eu vi. Quantas noitadas inesquecíveis proporcionadas pelo Aero Clube, que no mínimo uma vez por mês nos presenteava com seus bailes de gala sempre de muito bom-gosto. E as serestas, na verdadeira acepção do termo, que nos faziam viajar pelas músicas de boa qualidade? Não há que se criticar o inexorável crescimento populacional, a mudança de costumes que ocasionam a mudança de tradições, pois a vida é dinâmica e cada geração tem sua própria e diferente prateleira de nostalgia. Por isso não vai aqui nenhuma crítica; apenas e tão-somente a evocação da minha prateleira para o exercício do “recordar é viver”.

Publicado em agosto/1997